As transfusões sanguíneas são procedimentos cruciais que salvam vidas em diversos cenários médicos, desde hemorragias graves após cirurgias ou traumas até o tratamento de doenças sanguíneas como anemia e anemia falciforme. No entanto, as transfusões de sangue podem desencadear efeitos colaterais graves, sendo as reações alérgicas transfusionais (ATRs) particularmente comuns em crianças.
Embora a causa das ATRs seja frequentemente atribuída à alergia do tipo 1 mediada por imunoglobulina E (IgE), os alérgenos específicos responsáveis muitas vezes permanecem desconhecidos.
Um estudo recente realizado por cientistas japoneses lança luz sobre uma possível conexão entre as ATRs e as alergias alimentares em pacientes pediátricos, sugerindo que a dieta do doador antes da doação pode desempenhar um papel significativo.
A influência da dieta do doador nas reações alérgicas
A equipe de pesquisa, liderada pelo Dr. Ryu Yanagisawa do Hospital Universitário de Shinshu, Japão, em colaboração com o Dr. Minoru Tozuka e o Dr. Yasunori Ito do Hospital Infantil de Nagano, se dedicou a investigar essa possível relação.
O estudo, publicado na revista Allergy em janeiro de 2024, baseou-se na observação anterior da equipe de que pacientes pediátricos com alergias alimentares apresentavam maior suscetibilidade a ATRs.
Com base nessa premissa, os pesquisadores decidiram investigar se os alimentos consumidos pelo doador antes da doação de sangue poderiam estar associados ao desenvolvimento de ATRs em crianças com alergias alimentares.
Metodologia e resultados da pesquisa
Entre maio de 2022 e dezembro de 2023, os pesquisadores coletaram amostras de sangue de mais de 100 pacientes pediátricos com diagnóstico de alergia alimentar a ovos, trigo ou leite. Amostras de sangue também foram coletadas de dois doadores saudáveis antes e após a ingestão substancial desses alimentos, e o soro foi extraído.
Logo após a coleta de sangue de cada paciente alérgico, os pesquisadores realizaram testes de ativação de basófilos (BATs) expondo a amostra aos soros correspondentes. Os BATs avaliam a ativação dos basófilos, um tipo específico de glóbulo branco intimamente envolvido em reações alérgicas.
Os resultados mostraram que, em pacientes com alergia a ovo, os níveis de BAT foram significativamente mais altos quando o sangue foi exposto ao soro de doadores que haviam ingerido ovos. Além disso, o soro obtido de amostras de sangue de doadores coletadas quatro horas após a ingestão de ovos resultou em níveis de BAT consideravelmente mais altos do que aqueles coletados duas horas após a ingestão. Em contraste, os resultados para leite e trigo foram mais variáveis, com os níveis de BAT elevados apenas após a exposição ao soro de um dos dois doadores.
Para aprofundar a análise e fortalecer os resultados, os pesquisadores realizaram BATs com soros de dezesseis doadores adicionais. “Embora algumas diferenças tenham sido observadas entre os doadores, as amostras de sangue obtidas após a ingestão de ovos geralmente ativaram basófilos em casos de alergia a ovo com altos níveis de IgE específicos para a clara de ovo”, observa o Dr. Yanagisawa. “Da mesma forma, os níveis elevados de BAT em pacientes com alergia ao leite e ao trigo também foram associados aos níveis de IgE específicos para o alérgeno”.
As evidências obtidas neste estudo sugerem fortemente que as ATRs podem ser desencadeadas pelos alimentos consumidos pelos doadores antes da doação de sangue. Embora mais análises e experimentos sejam necessários para confirmar essa hipótese com maior certeza, esses esforços representam um passo inicial crucial para elucidar os mecanismos subjacentes às ATRs. “No futuro, poderia ser possível prever antecipadamente quem tem probabilidade de sofrer uma ATR”, conclui o Dr. Yanagisawa. “Com tempo suficiente, medidas preventivas e contramedidas para ATRs poderiam ser desenvolvidas, levando a transfusões sanguíneas mais seguras”.
A pesquisa, portanto, abre caminho para futuras investigações sobre a relação entre a dieta do doador e as reações alérgicas em receptores de transfusões sanguíneas. A compreensão mais aprofundada desses mecanismos pode levar ao desenvolvimento de estratégias para minimizar o risco de ATRs, tornando as transfusões sanguíneas mais seguras para todos os pacientes, especialmente para crianças com alergias alimentares.
Fonte: Science Daily